sexta-feira, 10 de abril de 2015

A TEORIA DO CONHECIMENTO DE DESCARTES EM PERGUNTAS E RESPOSTAS

I
1. Qual é o objetivo do pensamento de Descartes?
O objetivo principal de Descartes é constituir um sistema de conhecimentos firme e seguro no qual não haja lugar para crenças ou opiniões falsas. Descartes define conhecimento como crença verdadeira justificada de forma que seja impossível ser falsa.
2. Qual é a função da dúvida?
A função da dúvida é separar o verdadeiro do falso, abrindo o caminho para uma verdade indubitável a partir da qual se poderá reconstruir um sistema de conhecimentos bem organizado.
3. Por que razão o primeiro nível da aplicação da dúvida (o do argumento das ilusões dos sentidos) significa que Descartes nega o empirismo?
O empirismo é a tese de que os sentidos são a origem do conhecimento. Ora, o argumento das ilusões dos sentidos mostra que os sentidos não são fontes seguras de conhecimento e, por esse motivo, nunca poderão fornecer a primeira verdade indubitável com base na qual reconstruir o conhecimento. Isso leva Descartes a negar que os sentidos são a fonte de conhecimento.
4. Que resultados atinge Descartes com os argumentos das ilusões dos sentidos e dos sonhos?
Com estes argumentos, Descartes mostra que os sentidos não são fontes fidedignas de conhecimento e que é possível duvidar da existência das coisas sensíveis. Em suma, que nem a crença na fiabilidade dos sentidos nem a crença na existência do mundo exterior são indubitáveis.
5. Que função tem no pensamento de Descartes o argumento do Deus enganador?
A função do argumento do Deus enganador é mostrar que nem as verdades de razão, em particular os conhecimentos da matemática, são imunes à dúvida.
 6. Que resultados atinge Descartes com a dúvida metódica?
Descartes mostra que nem as verdades de razão nem as verdades sensoriais, isto é, que nem as proposições a priori nem as proposições a posteriori são indubitáveis e, portanto, que aparentemente nem umas nem outras constituem o ponto de partida do conhecimento.
7. Pode a dúvida cartesiana ser considerada cética?
Não. A dúvida cética tem por objetivo mostrar que o conhecimento não é possível. A dúvida cartesiana tem o objetivo oposto, mostrar que há conhecimento, isto é, verdades indubitáveis.
8. Descartes afirma que os céticos não conseguem demonstrar que não há conhecimento. Porquê?
Porque há pelo menos uma verdade, «penso, logo, existo», que resiste a todas as dúvidas, mesmo as mais radicais. Essa verdade é justificada pela própria dúvida. Quando duvidamos, estamos a pensar e, se pensamos, somos necessariamente alguma coisa. Este é um conhecimento que nenhum cético consegue abalar.
9. Que função tem Deus no sistema de Descartes?
Deus tem duas funções principais: garantir a fiabilidade das nossas faculdades (razão e sentidos) e a existência do mundo físico, isto é, recuperar o que tinha sido posto em causa pela dúvida metódica.
10. Se voltámos ao ponto de partida, qual a vantagem de toda esta investigação?
Voltámos ao ponto de partida, isto é, recuperámos as crenças que a dúvida pôs em questão, mas agora podemos estar certos da sua verdade, coisa que anteriormente não era possível.
11. Distinga o conhecimento intuitivo do conhecimento dedutivo?
Conhecemos por intuição aquilo que se apresenta imediatamente como claro e distinto à mente, sem resultar de uma cadeia de raciocínios. Os conhecimentos que resultam de uma cadeia de raciocínios são aqueles que obtemos por dedução.
12. Mostre como Descartes prova a existência de Deus a partir da ideia de perfeito.
Eis o argumento da existência de Deus como Ser perfeito (não enganador):
PONTO DE PARTIDA. A ideia de um ser perfeito (a ideia de perfeito) existe no meu pensamento. A prova arranca com esta pergunta: qual a causa ou o autor da ideia de perfeito? A questão não é saber se essa ideia existe, mas sim saber qual a razão de ser ou causa da sua existência no sujeito pensante.
DUAS HIPÓTESES DE SOLUÇÃO DO PROBLEMA. A causa da existência da ideia de perfeito ou é o sujeito pensante ou uma realidade diferente dele.
FORMULAÇÃO DO PRINCÍPIO DE CAUSALIDADE PARA DECIDIR QUAL DESTAS HIPÓTESES É VERDADEIRA. Em termos gerais, o princípio de causalidade diz que tudo tem uma causa. Em termos mais específicos, este princípio diz que no efeito não pode haver mais realidade do que na causa, ou seja, a causa não pode ser inferior ao efeito. A causa da ideia de perfeição tem de possuir formalmente (no seu ser) tanta perfeição quanto a que existe objetivamente na ideia.
O SUJEITO PENSANTE NÃO PODE SER A CAUSA DA IDEIA DE PERFEITO. Como já sabemos, o sujeito pensante é imperfeito. Sendo imperfeito, não pode ser causa da ideia de ser perfeito porque então haveria mais realidade no efeito do que na causa; o imperfeito não pode ser causa do que é perfeito. Se o sujeito pensante fosse a causa da ideia de ser perfeito (da ideia de Deus), teria de ser causa dos predicados que constituem a ideia de Deus. Como os predicados do ser perfeito são perfeições, o sujeito pensante teria de ser perfeito para ser o seu autor. Ora, isso não acontece. Logo, o sujeito pensante não pode ser a causa da ideia de perfeito.
DEUS, O SER PERFEITO, É A CAUSA NECESSÁRIA DA IDEIA DE PERFEITO. Se a ideia de um ser perfeito existe, necessariamente existe o ser perfeito que a «pôs» no sujeito pensante. Deus existe como causa da ideia de perfeito.

13. Tente criticar o argumento que Descartes usa para provar a existência de Deus como causa da ideia de perfeito (também conhecido como argumento da marca).
O princípio no qual se baseia o argumento – tem de haver pelo menos tanta realidade na causa de algo como no efeito – é contestável. Nesta ordem de ideias, a vida só poderia ser causada por coisas vivas. Ora, os cientistas afirmam hoje em dia que a vida evoluiu a partir de matéria inanimada. E não se vê como pode a existência de Deus ser uma evidência tão clara e distinta como a do sujeito pensante.
14. Só Deus garante que as minhas ideias claras e distintas são objetivas e verdadeiras. Ora, foi partindo de ideias claras e distintas – Existo como substância pensante, sou imperfeito – que Descartes provou a existência de um Deus em que podia confiar, de um Deus que é o garante de que, quando penso clara e distintamente algum objeto, não me engano. Não há algo de falacioso no raciocínio de Descartes?
Estamos perante aquilo que se convencionou chamar círculo cartesiano. Utiliza-se como instrumento de prova da existência de um Deus que vai garantir a objetividade das minhas ideias claras e distintas, precisamente o que depende da existência de Deus, ou seja, a crença de que as minhas ideias claras e distintas são verdadeiras. Por outro lado, como é o entendimento que se encarrega de provar a existência de Deus quando ainda pairam dúvidas sobre a sua capacidade, não será que também podemos duvidar da demonstração da existência de Deus?
O argumento parece circular. A existência de Deus é a garantia da veracidade das minhas ideias claras e distintas, mas é baseado nesta crença (na veracidade das ideias claras e distintas) que demonstro a existência de Deus.
15. Por que razão Descartes se empenha tanto em provar a existência de um ser perfeito? Qual o papel de Deus no sistema cartesiano?
A estabilidade da verdade é condição da ciência dedutiva que Descartes quer constituir. Não podemos prestar atenção a todas as verdades ao mesmo tempo porque a capacidade de atenção do nosso entendimento é muito restrita. Ora, se queremos constituir um corpo de conhecimentos científicos que progrida de verdade em verdade, que se torne cada vez mais amplo, não podemos, contudo, torná-las todas atualmente evidentes: temos de nos contentar em guardar as evidências na memória. O que me garante que a verdade não muda enquanto eu deixo de a conceber efetivamente, por outras palavras, o que me garante que as evidências às quais dei o meu assentimento continuam a ser evidências quando já nelas não penso, quando já não estão presentes efetivamente na minha consciência? Esta estabilidade da verdade que a hipótese do Deus enganador destruiria é agora garantida pela veracidade divina.


II
1

«Ora, depois de o conhecimento de Deus e da alma ter garantido a certeza dessa regra, é fácil compreender que os sonhos que imaginamos não devem de modo algum fazer-nos duvidar da verdade dos pensamentos que temos quando acordados. [...] Todas as nossas ideias ou noções devem ter algum fundamento verdadeiro; porque não seria possível que Deus, que é inteiramente perfeito e verídico, as tivesse posto em nós sem isso.»
René Descartes, Discurso do Método, Parte IV, Lisboa, Ed. Sá da Costa, 1981, p. 33
Depois de ter descoberto o Cogito, Descartes procede à recuperação de tudo o que tinha sido posto em questão pela dúvida metódica. De que modo faz isso?
Orientações:
1. A função de Deus no sistema cartesiano.
2. A prova da existência de Deus.
3. A recuperação da confiança nas proposições matemáticas e racionais.
4. A recuperação da crença na existência do mundo exterior.
A superação da dúvida cética deixou-nos na posse de uma verdade indubitável, o Cogito. Esta verdade é, dada a sua natureza, a base de todo o conhecimento, porque toda e qualquer proposição que seja possível dela deduzir é, devido às relações lógicas que com ela mantém, igualmente verdadeira. No entanto, a descoberta do Cogito corresponde à posição solipsista, uma vez que tudo o que sabemos, nessas circunstâncias, é que existe um eu e as suas experiências mentais. Descobrir o Cogito, por si só, não permite, portanto, resgatar o que a dúvida metódica tinha posto em questão. Enquanto a hipótese do Deus enganador não for definitivamente afastada (e o Cogito por si só não o pode fazer), não há nenhuma garantia de que é verdade o que conhecemos com clareza e distinção nem de que existe uma realidade que corresponde e é a causa das experiências mentais. Ora, a única forma de afastar a hipótese do Deus enganador é provar que Deus existe e não é enganador. É, portanto, isso que Descartes vai fazer. E depois, com a ajuda de Deus, é possível a Descartes demonstrar que a clareza e distinção é o critério de verdade e que existe um mundo objetivo exterior ao Cogito.
O argumento que Descartes apresentou a favor da existência de Deus é o seguinte. Ao investigarmos o conteúdo da nossa mente, descobrimos aí a ideia de Deus, isto é, a ideia de um ser perfeito. Qual a causa desta ideia de perfeição que o Cogito descobre em si próprio? Existem duas alternativas possíveis: a ideia de perfeição tem origem no próprio Cogito ou a sua causa é exterior ao Cogito. Ora, o Cogito é imperfeito (se fosse perfeito, não duvidaria), e como, segundo Descartes, para que uma coisa seja causa de outra tem de possuir pelo menos tanta realidade quanto o efeito a que der origem, não pode, por isso, ser a origem da ideia de perfeição. Qual é, então, a causa da ideia de perfeição que o Cogito descobre em si? A resposta de Descartes é a de que a ideia de perfeição tem de ter origem num ser que é ele próprio perfeito, isto é, em Deus, e, portanto, Deus tem de existir.
A dúvida metódica pôs em questão a fiabilidade das nossas faculdades racionais e a existência do mundo físico, em parte recorrendo à possibilidade de sermos vítimas de um Deus enganador. Ora, uma vez que Deus é perfeito, não é enganador. E, se Deus não é enganador, o que a mente concebe clara e distintamente não pode ser falso. A veracidade divina garante a fiabilidade das nossas capacidades racionais e, portanto, é eliminada a hipótese de nos estarmos a enganar quando aceitamos como sendo verdadeiro aquilo que a mente concebe com clareza e distinção.
Mas como posso estar certo de que o mundo existe? Como recupera Descartes a crença na existência do mundo exterior? Concebo clara e distintamente que sou uma substância pensante, que Deus existe e não me engana e que posso confiar no meu entendimento quando concebe que as coisas sensíveis são extensas. A minha razão, por si só (a priori), permitiu-me conhecer tudo isso de modo indubitável a partir do Cogito.
O problema da existência do mundo, no entanto, não pode ser resolvido dessa forma pelo nosso entendimento. O máximo que a razão nos pode assegurar é da existência e veracidade divina. O que nos leva a crer na existência do mundo é um sentimento obscuro, embora seja, segundo Descartes, uma certeza intensa na qual devemos confiar. Certas sensações que eu experimento acontecem contra a minha vontade. Não sou o seu autor, pois então acontecem quando eu quiser e como eu quiser. Essas sensações exigem a existência de algo de exterior a mim que seja a sua causa. A crença de que são as coisas corpóreas ou sensíveis a causa das sensações é uma crença irresistível, ou seja, uma espécie de ensinamento da natureza e um instinto. De tal modo assim é que, para a considerar falsa, teríamos de supor um Deus enganador, o que sabemos agora ser impossível. Logo, é preciso «confessar» que as coisas corpóreas existem.

2
Mostre como Descartes alcança, por intermédio da dúvida, a primeira verdade indubitável do sistema dos conhecimentos.
Na sua resposta, contemple os seguintes tópicos:
1. O projeto de Descartes quanto ao problema do conhecimento.
2. A natureza e a função da dúvida.
3. Os «conhecimentos» que examina em busca da primeira verdade.
4. O duplo resultado do exercício da dúvida.

Tendo como projeto reorganizar e fundamentar o conjunto dos conhecimentos, Descartes decide que o novo sistema dos conhecimentos terá de apresentar as seguintes caraterísticas:
1 – Ser constituído por bases ou princípios que resistam a qualquer dúvida, isto é, que sejam absolutamente evidentes (como diz a regra da evidência, não podem suscitar a mínima suspeita de que sejam falsos).
2 – Ser organizado de tal forma que os conhecimentos derivem na devida ordem dos primeiros princípios que foram estabelecidos.
Como encontrar conhecimentos absolutamente indubitáveis? Como encontrar verdades sobre as quais não possa recair a mínima suspeita de falsidade?
Utilizando a dúvida como instrumento de exame crítico dos conhecimentos. De todos? Não. Seria impossível analisá-los um a um. Descartes decide que vai submeter a exame crítico os «alicerces do edifício do conhecimento», ou seja, as bases ou princípios gerais em que se baseia.
Para que a dúvida metódica esteja intimamente ligada à primeira regra do método que identifica o verdadeiro com o absolutamente verdadeiro, evidente ou completamente claro e distinto (não há meio termo entre o verdadeiro e o falso), ela terá de ser estrategicamente hiperbólica. Isto quer dizer o seguinte: qualquer crença será considerada falsa se nela detetarmos a mínima fragilidade e qualquer faculdade que usamos para conhecer será rejeitada como sempre enganadora se alguma vez nos tiver enganado.
Mediante este princípio hiperbólico de aplicação da dúvida, Descartes pretende separar radicalmente o verdadeiro do falso para encontrar conhecimentos que sejam:
A – Fundamentais ou fundantes: deles dependerão todos os outros conhecimentos;
B – Absolutamente verdadeiros ou indubitáveis para que as bases do sistema do saber sejam indiscutivelmente sólidas e firmes.
Então, apliquemos a dúvida, examinemos de forma implacável os princípios em que o saber tradicional assenta.
Descartes começa por examinar criticamente a ideia de que os sentidos são o ponto de partida do conhecimento. Rejeita, contudo, que o conhecimento derive da experiência sensível porque, aplicando a regra hiperbólica associada à dúvida, se apercebe facilmente de que, enganando-nos algumas vezes, os sentidos não são de confiar quanto às informações que nos dão sobre as propriedades das coisas sensíveis. A rejeição do empirismo está desde já claramente estabelecida: o conhecimento não começa com a experiência porquê não pode começar com o que várias vezes nos ilude. O que me engana algumas vezes não merece o mínimo crédito.
E as coisas sensíveis ou físicas – o mundo físico ou material, natural – sobre as quais os sentidos nos transmitem tantas informações erradas? Será que a crença na sua existência está ao abrigo de qualquer dúvida? Será que esta crença pode ser o indubitável princípio do sistema dos conhecimentos?
Parece absurdo pôr em causa a existência real de coisas físicas, mas lembremos que, de acordo com a regra hiperbólica de aplicação da dúvida metódica, basta uma leve e frágil suspeita – que não deixa por isso de ser suspeita e motivo de desconfiança – para que uma crença seja declarada falsa. Baseado na dificuldade em encontrar um critério que distinga de forma absolutamente clara o sonho da realidade, o que vivemos acordados e o que vivemos a dormir, Descartes argumenta que, por mais frágil que seja o argumento, temos razão para duvidar de que as coisas físicas existam realmente. Não é verdade que vivemos tão intensamente o que nos acontece durante os sonhos e o que nos acontece no estado de vigília? O mundo físico pode ser um sonho, uma ilusão e não uma realidade. A crença na sua real existência é colocada sob suspeita e hiperbolicamente considerada falsa.
Deixemos o plano dos sentidos e das coisas sensíveis – o mundo físico ou sensível. Parece que agora a dúvida encontrará algo que lhe resista completamente. Não é verdade que objetos inteligíveis como os conhecimentos matemáticos gozam de uma credibilidade a toda a prova. Parece insensato pôr em causa que 2 + 2 = 4. Mas lembremos: basta uma frágil suspeita, uma razão minimamente perturbadora, para pôr em causa certos conhecimentos. Debrucemo-nos sobre os mais simples. Se puderem ser objeto de dúvida, mais facilmente o serão os mais complexos. Acreditamos que 2 + 2 = 4. Parece inconcebível duvidar disto. Mas…. mas ouvi dizer que Deus me criou e que, criando-me, criou o meu entendimento depositando nele algumas verdades elementares como 2 + 2 = 4. Ora, também se diz do meu suposto criador que é omnipotente. Omnipotente? Quer dizer que… é capaz de tudo. HUM… Se é capaz de tudo, o que me garante que não tenha criado o meu entendimento destinando-o ao erro sem disso me informar? O que me garante que Deus não seja um ser maligno que se diverte a enganar-me e a baralhar o meu entendimento, levando-o a considerar verdadeiro o que pode ser falso e falso o que pode ser verdadeiro. Esta hipótese parece demasiado «metafísica», o cúmulo do absurdo, mas a verdade é que a suspeita se instala. E, como basta suspeitar por pouco que seja de uma crença para a considerar falsa, então devemos reconhecer que as supostas verdades matemáticas podem ser falsidades.
Chegado a este ponto, Descartes pensa: todos os conhecimentos, quer os respeitantes a objetos sensíveis quer os referentes a objetos inteligíveis, estão sob suspeita. Não resistiram ao exame da dúvida. Hiperbolicamente, diremos que são todos falsos. Mas, se tudo é falso, não será que falhou o projeto de encontrar um conhecimento indubitável que seja o primeiro princípio em que assentam todos os conhecimentos. Não estamos condenados ao ceticismo, à ideia de que não há conhecimentos verdadeiros.
Descartes pensa com mais profundidade: se o exercício da dúvida me conduziu a este ponto, devo reconhecer que a dúvida é um ato que tem de ser exercido por alguém, por um sujeito. O sujeito que tudo pôs em causa não pode pôr em causa a sua existência, não há como fazê-lo. O exercício da dúvida é a «prova» de que ele existe. Como duvidar é um ato do pensamento, devo dizer que «penso – duvido de todos os conhecimentos neste momento –, logo, existo». A existência do sujeito que pensa é a condição sem a qual não é possível duvidar.
«Penso, logo, existo» – cogito ergo sum – é a primeira e absoluta verdade que encontramos. Dela, por mais que nos esforcemos não podemos duvidar. Será por isso o primeiro princípio do sistema dos conhecimentos que dele iremos deduzir de forma puramente racional. Temos lançada a primeira pedra do «edifício» dos conhecimentos. O termo cogito costuma usar-se como abreviatura desta primeira verdade.

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