sábado, 26 de fevereiro de 2011

NIETZSCHE 7 - A MORTE DE DEUS



A MORTE DE DEUS
Deus, como Juiz do bem e do mal, era o fundamento da moral cristã. Nietzsche critica a moral cristã como moral que atrofia e nega a vida porque inventa uma outra vida para des­valorizar a que vivemos. O objectivo dessa crítica é libertar esta, libertando-a de uma moral que se vai denunciar como imoral e indigna porque intoxicante. Ora, isso só é possível mos­trando que Deus, o suporte ou o fundamento dessa moral antinatural, não é digno de crença porque é unia invenção ou ficção dos que não conseguem suportar a vida, ou seja, é a negação da vida. Para suprimir a moral cristã, que condena a existência, é, portanto, necessário suprimir Deus. «Bem e mal são os preconceitos de Deus».
Em nome de Deus, puro espírito, declara-se guerra à sexualidade, a fonte da vida. A santidade, entendida como espiritualização castradora da sexualidade, é o ideal que a moral cristã aponta ao homem como seu dever, para agradar a Deus. Um Deus a quem agrada este tipo de homem, mutilado, este tipo de vida doentia, é uma realidade corrompida e degenerada. Em nome de tudo o que é sagrado (a vida é o sagrado por excelência), devemos desmascarar como ficção nociva este Deus profanador da vida.
O conceito cristão de Deus é a suprema das contradições — é considerado fonte da vida eterna mas está ao serviço de tudo o que nega e desvaloriza a vida. Porquê? Porque a «Vida eterna» nada mais é do que o resultado do ódio a «esta vida», à terra, à na­tureza. Declara-se, mediante esse conceito (vida eterna), a guerra à vontade de viver, de glorificar a vida. Assim, a vida acaba onde começa o «Reino de Deus».
Que Deus, que não passa de uma realidade imaginária, de ilusão, sirva para cruci­ficar «esta vida», negando-a nos seus fundamentos mais profundos, é algo que não se pode suportar mais. Um tal Deus é incrível, é um contra-senso. Só a sua morte (a de­claração de que Ele é uma ilusão nociva, é indigno de crença) pode libertar e desintoxicar a vida, salvá-la da prisão do Absoluto.
A expressão «morte de Deus» deve ser entendida como significando que a fé em Deus morreu, que um tal ser em flagrante contradição com a vida é incrível.
A «morte de Deus» corresponde a um acontecimento histórico, é um facto da civiliza­ção do século XIX e Nietzsche considera-o o último acontecimento da história do cristia­nismo. O clima cultural dos séculos XVIII e XIX permite-nos compreender a desaparição de Deus do horizonte das coisas humanas. O Iluminismo lutou contra a intolerância e o obscu­rantismo da Igreja; o progresso científico, herdeiro legítimo das Luzes, deu ao homem con­fiança no seu poder, levando-o a julgar-se a medida de todas as coisas; as revoluções soci­ais e políticas destruíram a ideia de que certos governos humanos eram de direito divino, isto é, de que certos homens eram os representantes de Deus na Terra e que o seu governo era um mandato de Deus. Porventura, o mais profundo golpe na fé em Deus foi desferido por Darwin. A doutrina da evolução das espécies negava que a espécie humana tivesse sido criada à parte das outras espécies, tivesse sido objecto de uma criação especial. Adão e Eva não são os pais da humanidade, nunca existiu o paraíso nem faz sentido a ideia de inferno. Pode dizer-se que não é simplesmente a palavra de Deus que é posta em causa, mas a pró­pria existência de Deus como criador do homem.

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